Considerações sobre ...2
2 – Sobre o
Acordo, desacordo ortográfico ou “discutir o sexo dos anjos” enquanto os “Bárbaros” tomam de assalto “Constantinopla”(a nossa Língua)?
Volta e meia leio opiniões acerca do “Acordo Ortográfico”, ou “Novo Acordo Ortográfico e até “(Des)acordo Ortográfico”.
Também em muitos artigos de imprensa a nota - “o autor escreve segundo o antigo acordo ortográfico.
Alguns escritores têm também, como ponto de honra, afirmarem o mesmo.
Finalmente há os defensores acérrimos do dito cujo acordo.
Espero não ser o único que se está nas tintas para os acordos ortográficos que já houve, que há e outros a haver.
Seja qual for a grafia adoptada por lei nunca deixará de ser uma questão de convenção.
Eu, que nunca fui de seguir regras, sempre tive o “meu acordo ortográfico”. É certo que o meu professor da Primária era rigoroso quanto a ortografia e quem pagava eram as minhas ricas mãozinhas. Pensava o professor que se a ortografia não me entrava pela memória talvez entrasse pela pele com a ajuda da “santa luzia dos cinco olhos”. Ajudou, mas, mesmo assim, às vezes ainda ajo como se não houvesse regras ortográficas.
II - Entretanto num Curso que fiz tive uma cadeira que se chamava “Curso de história da Língua Portuguesa”.
1. Vou, então, transcrever algumas ideias que tirei dos livros que me ajudaram a fazer a dita cadeira.
Do Livro/Manual - Curso de história da Língua Portuguesa, Ivo Castro, Universidade Aberta, Lisboa,1981.
Pág.82
Evolução do Latim. “[…] Uma língua literária escrita, ou latim literário, que nos primeiros tempos não devia diferenciar-se excessivamente da língua falada pelos seus escritores e leitores.[…]
- Latim arcaico “[…] (até o séc. I aC) Seguiu-se uma fase de esplendor literário, acompanhado de um maior afastamento em relação à língua falada, que denominamos latim clássico;
- Latim imperial (séc. II – IV dC) “[…] o latim literário não cessa com o fim do Império, essa língua quase completa encerrada em texto designa-se por latim tardio (ou baixo latim) […]”
Pág. 83) “[…]
- Havia cinco casos no latim clássico:
Nominativo – sujeito.
Genitivo – complemento determinante.
Dativo – objecto indirecto.
(Pág. 84)
Acusativo – objecto directo.
Ablativo – diversas funções circunstanciais […]
As declinações que agrupavam todos os substantivos e adjectivos segundo a sua forma , eram cinco […] seguindo uma tendência geral das línguas indo-europeias, o latim arcaico simplificou o sistema de casos: O locativo e o Instrumental fundiram-se com o Ablativo, que era geralmente usado com preposições. O Vocativo tinha quase sempre a forma do Nominativo.
- Latim Clássico
[…] É no séc. I da nossa era, chamado «século de Augusto», que começou a produzir-se uma séria diferenciação entre o latim literário e o latim falado. […] Colonizadores (geralmente dos estratos mais baixos) e indígenas, que mais ou menos aceitam romanizar-se. Cada um destes grupos usava um latim estruturado segundo normas diferentes […] variedades do latim. A mais primorosa delas, usada na literatura, era o
(Pág. 85)
sermo urbanus, […] sermo cotidianus ou usualis, que era a línguagem quotidiana das classes cultas. […] o sermo plebeius ou vulgaris, que era o falar do povo sem, ou com baixa, instrução […] e o sermo rusticus, os falares não urbanus. […] do contacto do latim com as línguas itálicas faladas anteriormente nas províncias conquistadas (etrusco, celta, etc) : constituem o latim provincialis. […]
Latim Imperial corresponde ao dos séc. II – V dC […] maior afastamento entre a língua literária e a língua falada (o latim vulgar).
(Pág.87)
Latim tardio (séc. V a XVIII) […] A distância entre a língua falada e o latim aprendido nas gramáticas provoca na escrita (em latim) o aparecimento de numerosos erros, que amiúde reflectem as tendências diferenciadoras da língua pela pessoa que escreve.
(Pág. 88)
[…] Certamente, com acontece em todas as línguas […] a influência da língua falada, influência «in crescendo»-
(pág. 120)
[…] O latim vulgar reduzi-los-á (os casos) drasticamente do modo seguinte:
[…] Nas Penínsulas Ibérica e Itálica […] o sistema reduziu-se só a um caso, o acusativo, […]
III - Do livro - "História da Língua Portuguesa", por Paul Teyssier, Livraria Sá da Costa Editora, 8ª edição, Lisboa, 2001.
Idade Média - Formação do Português.
(pág. 24)
- "Apesar das sua imprecisões e incoerências, a grafia do galego-português medieval como mais regular e «fonética» [...] "
(pág. 69)
2 - Renascimento - O latinismo
a) " [...] O latinismo vai consistir muitas vezes em adoptar uma ortografia etimológica para tornar a forma escrita das palavras mais próximas do latim [...]. É possível ver pelos exemplos citados que, se alguns desses latinismos são puramente gráficos, outros dizem respeito à forma fonética da palavra. [...]"
(pág.70)
b - "[...] Um número importante de palavras eruditas, ou de formas alatinadas, introduziram-se, assim, no séc. XVI e, desde então, integram o vocabulário da língua." [...]
(pág.73).
3 - Fins séc. XVIII/XIX
a) "[...] A colocação do pronome é fixada de maneira mais rígida (João sentou-se), quando num enunciado desse tipo, a língua clássica empregava igualmente (João se sentou) [...] 5. "[...] As formas eruditas não raro suplantaram as formas populares que as precederam, de maneira que o português latiniza mais hoje do que o fazia outrora.[...]"
III - As minhas conclusões
- Conforme o latim falado se afasta do latim escrito, este vai-se simplificando segundo a oralidade. Este fenómeno nota-se mais profundamente no sistema de casos.
Latim Inicial ---------- Latim Arcaico/Clássico/Vulgar -------- Língua Românica
--------------------------------------------------------------------------------------------------- Itália e Ibéria
Nominativo -------------Nominativo/Vocativo
Vocativo
Genitivo ----------------- Genitivo
Dativo --------------------Dativo
Acusativo ---------------- Acusativo --------------------------------- Acusativo
Ablativo ------------------Ablativo/locativo/Instrumental
Locativo
Instrumental
Podemos dizer que a Língua Escrita é um travão à evolução da língua – fossilização da língua – avançando mais tardiamente para se aproximar da língua falada.
- A língua Portuguesa seguia esta tendência, começando pela sua grafia reflectir a língua falada.
- Esta evolução foi contrariada pela renascença e pelo classicismo com o regresso “à pureza etimológica da língua”.
- Com este regresso “ao latim” a língua falada aprofundou o fosso existente entre o falar e o escrever.
- Os acordos ortográficos aparecem com a necessidade de aproximar a língua escrita da língua falada.
- O acordo ortográfico entre os diversos “falares” do português é a procura de um português escrito que reflita as oralidades diferentes da nossa língua, de modo a que ela não se fragmente, pelo menos na sua grafia, como aconteceu ao latim e anteriormente ao Indo-Europeu.
- Parece-me ser um esforço voluntarioso que não conseguirá travar a evolução natural de todas as línguas – a lei do menor esforço.
- Finalmente a maior ameaça à Língua Portuguesa (europeia) não vem do português falado e escrito noutras paragens, mas sim do Colonialismo Anglo-saxónico a que assistimos (alguns assistem) impavidamente e serenos.
a) Não há opinador, jornalista, colunista, que se preze, que escreva sobre seja o que for sem um termo, ou vários, em inglês
b) Há jornalistas especializados em economia que habitam a imprensa escrita e falada que ao tentarem explicar medidas dos ministérios da economia, das finanças, dos organismos europeus, não conseguem explicar nada pois falam “economês”.
Um leitor, ou ouvinte, leigo (como eu) que gostaria de saber o que quem nos governa pretende fica ainda mais, ou tão, desinformado como antes da explicação dos especialistas.
O que me leva a considerar que ou não sabem o que dizem e repetem o que ouviram dizer aos senhores governantes, ou se sabem, estão ao serviço deles, governantes, e convém manter-nos desinformados.
c) Também aberrantes são os nomes com que se designam diversas actividades culturais, firmas comerciais, etc. [resort, workshop,village,Lisbon film festival] e muitos outros de que agora não me lembro e não me apetece ir investigar.
9 . É por isto que penso que defender, ou bater, nas convenções ortográficas do português, é ver Constantinopla cair nas mãos dos Turcos, enquanto os teólogos discutem o sexo dos anjos (acordo ortográfico sim, ou não).
Como diria o Solnado, “façam o favor de serem felizes”,
Zé Onofre
PS - Gostaria, contudo, que os meus netos e sua descendência falassem uma língua filiada no Português e não no Inglês. Também gostaria de falar uma lingua filiada no falar dos povos Ibéricos antes da colonização Indo-Europeu.