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024/02/13
Sobre Almocreva, de Zé LG, 13.02.24 em https://alvitrando.blogs.sapo.pt/
Sob um céu azul remendado
Que levemente protege
Um casal no cimo do horizonte,
Tendo por vigia um velho poste,
Sente-se que para além daquela cortina
Há vidas escondidas,
Mas não esquecidas.
Vidas
Encostadas ao cajado
Olhando o infinito,
Nas cabeças do seu gado
Que pacientemente mordem
As folhas das ervas quase ressequidas.
Vidas de homens antigos
E de mulheres feiticeiras
Que de foicinha em punho
Segam o trigo maduro.
Sob um sol inclemente
Lançam à calmaria
Uma canção dolente,
Dorida,
Marcando o ritmo das mãos calejadas.
Vidas leiloadas na praça da Vila
A tanto à jorna.
Quanto mais vidas,
A serem leiloadas,
Menor a jorna se paga
Por vidas quase acabadas.
Uma voz que se levanta,
Um zumbido que atravessa a praça.
Logo de seguida,
Ferraduras em tropel no empedrado,
Tiros disparados sem rumo,
Mas com destino.
Uns resistem,
De uma vida,
Que no chão da praça jaz,
Um rio de sangue nasce
Uns vão para a prisão,
Outros para casa acalentando a fome.
Os assassinos regressam ao quartel
Em paz.
Zé Onofre