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Notas à Margem

Notas à Margem

01
Abr24

Das Eras Parte VI - 30

zé onofre

 

30  Abril 024

 

024/04/01

 

Há já muito

Que não subia esta encosta.

De penedo em raiz,

De raiz em esforço,

Me levava ao cume deste Monte.

 

Hoje fiz o velho caminho

Com mais esforço.

O tempo roeu os penedos,

Envelheceu as raízes,

Mas consegui

E aqui estou no cume do monte.

 

Sento-me,

Respiro fundo,

Fecho os sentidos por um momento,

Estou só

Encerrado em mim.

 

Após uma eternidade

Abro-me ao vento,

Ao céu,

Ao verde do monte,

Ao longínquo horizonte.

 

Olho em redor.

Apenas um cinzento pesado,

Sombrio quase negro.

Procuro no véu do horizonte

Um rasgão

Por onde veja um pouco

De uma manhã clara.

 

Lentamente rodo.

Procuro no negro longe

O azul que não aparece

E que tanto desejo.

Desistente, vou deitar os olhos ao chão,

Quando no mais afastado monte

Uma pequena brecha se rasga

E um tímido raio de sol,

Mostra o clarear

De uma nova madrugada.

 

Deito os ouvidos ao vento

Que já não sopra

Segredos

Lá dos confins de onde vem.

Vem carregado

De lâminas afiadas

Que cortam e castigam os ouvidos

Quem ousa,

Depois de tanto esquecimento,

Colher palavras semeadas

Por bocas desesperadas.

 

Apenas um silvo

Se faz ouvir.

Um grito único

De mil vozes tão cansadas

De tanto pedir socorro

No vento que corre pela Terra.

Mil vozes tão desesperadas

De tanto esperar o calor de uma canção,

A carícia de uma palavra de esperança,

Um canto que anuncie um novo amanhecer.

 

Um uivo de desespero,

Em seu último alento,

Lançado ao vento

Que os meus ouvidos fere,

Ou uma voz urgente,

Que nos grita,

Ainda estamos vivos,

Vamos em frente,

Que ninguém ouse desistir,

Que ninguém desespere

Uma nova madrugada está para florir.

  Zé Onofre

 

27
Fev24

Canto triste - XXV

zé onofre

                            Canção XXV

 

024/02/26

Ó gentes minhas companheiras, 

Que das serras fazeis queijo,

Que da terra amassada fazeis pão,

Que lavrais peixes nos mares,

Que da matéria bruta criais beleza,

Que em todos balcões servis vida,

Que o caos organizais em números,

Pensemos baixinho, com sinceridade

Como ficamos tão sem força assim

Para não levarmos a luta até ao fim.

 

Ó gentes, minhas companheiras,

Que sacrificáveis o descanso,

Depois de um dia de labuta,

E em negras noites de sussurros

Com força nos braços, brilho no olhar

Desbravávamos novos caminhos

À procura de um futuro sem classes.

Pensemos baixinho, com sinceridade

Como ficamos tão sem força assim

Para não levarmos a luta até ao fim.

 

Digamos companheiras, digamos,

Aos ventos que sopram dos montes,

Do queijo que em vossas mãos nascem,

Das mãos que da terra arrancam pão,

Do coro das máquinas que vossos dedos regem,

Dos números a contar sob a vossa mestria,

Dos peixes embalados nos vossos berços, 

Digamos baixinho, com sinceridade

Como ficamos tão sem forças assim

Para não levarmos a luta até ao fim.

 

Ouçamos no vento, ouçamos com atenção

O que um diz na solidão do monte,

O que outro prega na rabeta do arado,

O que alguém resmunga junto à máquina,

O espanto da realidade na máquina de calcular,

O gemer dos dias nos barcos a baloiçar,

Ouçamos baixinho, gritemos com verdade

Que ficarmos tão sem forças assim

Desonra a quem nos trouxe perto do fim.

   Zé Onofre

14
Jan24

Comentários - 330

zé onofre

                   330 

 

023/12/03

 

Sobre “hoje”, Di em  https://1mulher.blogs.sapo.pt/, 023/12/03

 

Poesia sobre azul

Que o vento,

Esse poeta inquieto,

Escreve,

Apaga,

Reescreve,

Explana,

Concentra,

Esfarrapa.

 

Poesia

Do momento que passa

Coerente

Com o momento do vento

Subtil intérprete

Do instante.

 

Com vagar escreve

E apenas levemente modifica

O que ainda agora

Escreveu.

 

Com passos apressados

Inicia

Apaga

Palavras tão escangalhadas

Como os seus pés,

Inquietos corredores.

 

Quando

Num assomo se enfurece

Mistura as palavras dos dicionários,

Faz malabarismos com os alfabetos,

Misturando na sua escrita

Pó e dor,

Sangue que de veias abertas,

Em corrente se escoa,

Que apenas corpos

De olhos vítreos,

Caídos na areia,

Sabem interpretar.

 

E a nós,

que nada entendemos

Sobre o que vemos

Do deserto pintado

A vermelho de sangue,  

Espelhado no céu,

Resta-nos calar a pena

E deixarmos ao vento

Escrever a história.

   Zé Onofre

11
Jan24

Dia de hoje 93

zé onofre

              93

 

024/01/11

 

Pergunto ao vento que passa,

Por que é que passa

Sem nada ter para contar.

Será que de vagar passa

E não consegue sussurrar?

 

Pergunto ao vento que passa

Por que é passa

Sem nada ter para contar.

Será que de pressa passa

E não consegue falar?

 

Pergunto ao vento que passa,

Por que é que se passa de vagar,

Ou se no passar tem pressa,

Nada tem para contar.

 

Pergunto, então, a mim mesmo,

Depois de tanto vem a ir e a vir,

Se é o vento sem segredos,

Ou se eu não os consigo ouvir.

  Zé Onofre

28
Dez23

Comentários - 327

zé onofre

                   327  

 

023/11/08

 

Sobre, Nunca estamos satisfeitos, Manu Pereira em https://existeumolhar.blogs.sapo.pt/ ,em /11/08

 

Nunca diga que a chuva

Não permite vadiar.

Certamente nunca experimentou,

Num dia, ou noite,

De chuva e vento,

Com um capote dos antigos

Ir sem destino, apenas andar.

O capote

Bem aconchegado,

Apenas com os olhos de fora,

E o cabelo certamente,

Deixar correr a água

Pelo corpo

E voltar quando se está cansado.

Nunca experimentou

Chegar a casa como um pinto,

Despir a roupa encharcada,

Tomar um banho quente,

Vestir o pijama,

Deitar-se a ler um livro,

Ou ficar ali estendido

Entre os cobertores,

Agora a ouvir o dueto

Da chuva e do vento

Cantando na vidraça

Ou por nas telhas

Assobiando na esquina da casa.

  Zé Onofre

26
Set23

Histórias de A a Z para aprender a ler e escrever - Livro III - Lenda

zé onofre

     LENDA 

 

Era uma vez Lara,

Pastora de longo cabelo,

Que guardava o gado

Ao pé de um castelo.

 

Era uma vez Luís,

De olhar penetrante,

Que do alto do castelo

Vigiava o mundo distante.

 

Um certo dia Luís,

Cansado do horizonte,

Descansou os olhos

Na encosta do monte

 

Reparou, então, em Lara

Pastora de rara beleza

Que guardava o seu gado

Junto á fortaleza.

 

Esquecendo a vigia,

Descurando o dever,

Voando pela escada

Com a Lara foi ter.

 

Vieram os inimigos,

Velozes e matreiros

Tomam o castelo

Fazem-nos prisioneiros.

LENDA.jpg

Vendo tudo perdido

Sem outros meios

Chamou em socorro

O amigo feiticeiro.

 

Atendido o pedido

Foi só um momento

Ficaram penedos

Largados no tempo.

 

Hoje, quem lá sobe

Sente um arrepio

Ao ver aquela beleza

Ao sentir o vento frio

 

E diz, ainda, a lenda

Que o amor continua

E no mês de Agosto

Dançam à luz da lua

   Zé Onofre

16
Set23

Histórias de A a Z para aprender a ler e escrever - Livro III- MARIANITA

zé onofre

MARIANITA, 2004-12-10

 

Marianita

Da janela do seu quarto

Viu num Outono cinzento

Negro fantasma

Esbracejando ao vento

 

Marianita

Menina atrevida

Sem medo

Subiu ao outeiro

Desvendar o terrível segredo.

 

Marianita

Firme e decidida

Lá vai lenta e resolvida

Ao cimo do outeiro.

O terrível fantasma

Era apenas um castanheiro.

  Zé Onofre

MARIANITA.jpg

 

 

03
Set23

Notas à margem - Dia de hoje 93

zé onofre

               93 – Natal

 

023/09/03

 

Este ano,

O meu desejo de Natal,

É que não haja Natal

Por desnecessário e anacrónico.

 

Porque desde sempre

Apenas o sol iluminava os dias

E que a noite

Apenas conhecia a lua e as estrelas.

 

Porque o solo

Apenas tinha memória

De ser rasgado pelos ferros do arado,

Apenas fora pisado por tratores,

E nunca sentira o peso de botas cardadas,

Nem de máquinas de lagartas.

 

As cidades apenas sabiam

De edifícios que eram lares

E não construções de paredes esventradas.

 

Os verdes e floridos jardins

Tinham apenas a lembrança

Das alegrias, tristezas, brincadeiras e brigas das crianças,

Do arrulhar e arrufos de namorados,

Do silêncio/memória dos reformados.

 

Nos bosques apenas havia vestígios

Do desenvolvimento harmonioso da vida selvagem,

Ao som do vento e da chuva,

Da brancura da neve e das geadas,

Dos temporais e das bonanças,

De homens, mulheres e crianças

Em alegres passeios e piqueniques.

 

Os rios e os lagos desde há muito

Eram o habitat da vida aquática,

A serenidade das suas águas

Apenas eram cortadas por árvores que tombavam,

Pelo remar de pequenos barcos,

Onde felizes humanos

Conversavam e cantavam a vida.

Havia também o registo de corpos,

Mais ou menos elegantes

Que nas suas águas procuravam prazer.

 

Os mares, desde tempos imemoriais,

Apenas eram navegados por cruzeiros,

Navios cargueiros,

Respeitados pelos humanos

Que nunca dele fizeram o seu caixote do lixo,

Quanto mais estrada de máquinas de morte.

 

Os ares, apenas sabiam,

Que eram o lar das nuvens e das aves,

A fonte dos relâmpagos e dos trovões,

Caminho de aviões que os cruzavam

Com intenções de negócios,

Ou como mensageiros de tristezas e alegrias,

Ou apenas destino de descanso e recreio.

Os ares nunca souberam que poderiam ser voados,

Por máquinas furiosas que desovavam,

Inclementes, ovos de morte sobre a superfície.

 

As ruas, praças e avenidas,

Desde tempos antigos

Sentem passos de pessoas,

Sem pressas nem correrias,

Que apenas viviam a vida

Com alegrias, choros, tristezas e gargalhadas,

A olharem o longe sem medo

Que do nada surgisse a morte.

O seu único receio era que um  pássaro passageiro

Largasse sobre elas um dejeto ligeiro.

 

Dos campos, das minas, das fábricas e dos mares

Apenas se fabricava e extraía o necessário.

Não se produzia para o excesso,

Nem para acumular riqueza,

E produzir pobres.

 

Este ano,

O meu desejo de Natal,

É que não haja Natal

Por desnecessário e anacrónico.

   Zé Onofre

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